Sobre confiança, relacionamentos e a saudade

Louise Nazareth
6 min readSep 24, 2019

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Confiança.

Confiança é uma coisa que a gente constrói com o tempo. Na maioria das vezes, é uma construção de situações difíceis para as quais encontramos uma resolução satisfatória para as nossas diversas subjetividades. Confiança também é acreditar que vai (ou não) acontecer pelo simples fato de entendermos que fizemos nosso melhor, e ainda por cima, que conhecemos o suficiente de outra pessoa para nos entregarmos ao processo.

Imagem Freepik @mindandi

Se entregar para um processo requer alguns aspectos que precisam ser encarados com muita sinceridade. Como, por exemplo, tomar decisões conscientes sabendo que, mesmo muito dolorosas, são para um bem maior. O bem do processo. E confiar no processo é saber que nossas decisões, quando conscientes, tomadas pelo bem maior a longo prazo, será um passo muito arriscado rumo ao novo. Rumo a um caminho que ainda não testamos por diversos fatores.

No meu caso, coragem.

Ou a falta dela. De agir conforme meu coração acredita que é melhor para nós dois. Agir de acordo com uma ânsia que cresce e angustia seu peito, te fazer retorcer noites a fio e por fim, sua vitalidade é drenada até que você tenha a tal da energia para agir. Ainda falando sobre coragem, demorei muitos anos para perceber que eu não era o grande problema (que habita minha cabeça) para que o meu último relacionamento não fosse para frente. Demorei muito para entender que esse pensamento é um tanto egoísta, e também descredencia a outra parte de ter seus próprios méritos de não ter dado certo também. Ora! Imagina se apenas eu, ou você, fôssemos os grandes culpados das coisas darem errado, não seria maravilhoso? Pensa comigo, se eu sou o único fator de risco para algo não acontecer, então é fácil de resolver! A questão é o meu trejeito, o meu sotaque, o meu gosto musical… a minha maneira de enxergar o mundo, a minha postura frente as mazelas da vida? Se for isto, poxa, é questão de conversar e ajustar, não? É uma questão mais acessível para uma resolução mais perene.

Mas a vida, a vida não funciona assim.
É muito vitimismo para uma pessoa só, e convenhamos, às vezes até quando tudo é perfeito, falta alguma coisa…

Aprendi nos últimos tempos coisas muito valiosas sobre a vida. Aprendi, sobre a minha própria, que esses rótulos que usamos para determinar relações no instinto de mantê-las presas a nós, é pura balela. Por exemplo, chamar alguém de meu. Meu namorado. Meu marido. Meu amigo. Meu cachorro… Enfim, meu. Chamar um ser vivo assim é muito mais uma coisa de construção social, daquelas que só fazemos por que não temos coragem de ver que a vida é uma eterna viagem e nada é para sempre. Hoje em dia até os motoristas mudam, e cobradores já nem existem mais em alguns lugares. A vida se torna um domo de ilusão quando a gente acredita que algo meu é para sempre. Sabe, eu aprendi que um relacionamento não depende de uma nomenclatura para acontecer. Depende de 2, ou mais, pessoas para que haja uma rotina… uma dinâmica. A tal da dinâmica.

E quando você percebe que existe um padrão e que essa pessoa está com você, mesmo falando que nada do que você é real, é ela quem se engana. Porque é ela que se nega a reparar que as dinâmicas é que formam os relacionamentos e não o contrário.

Eu amei profundamente uma pessoa. Ainda amo, na verdade. E acredito que tenha sido o meu primeiro amor real em quase trinta e um anos de vida. Foi um amor de entrega, de vivências, de muita cumplicidade e de confiança. Acho que amar profundamente não existe, mas sinto que o amor que eu tenho por essa pessoa, seria como se eu pudesse perder um braço na guerra mas nada me afligiria mais do que não vê-la ao meu lado todas as noites ao dormir. Para mim, esse amor foi desse jeito. Passar noites em claro, sofrer juntos. Crescer, amadurecer com essa pessoa ao seu lado e por fim, se tornar alguém completamente diferente em anos de convivência e ainda assim não perder o sabor de apreciar cada gesto e cada movimento deste ser humano. Seu desenvolvimento, suas conquistas acadêmicas. Seus cabelos, ora longos, ora cortados, ora azuis, ora cor natural. E por mais estranho, ou terrível que pareça, eu esperaria anos e anos até que ele estivesse pronto para se unir a mim, bastava que me pedisse, e precisaria de muito para isso.

O grande problema é que eu não soube entender que o seu comportamento me mostrava que ele não queria e não iria me pedir isto. Que ele estava caminhando para uma jornada diferente e que eu me arrependo muito de não ter visto isto antes.

Mas, tudo bem, sabe? Eu fiz tudo isso de coração e não me arrependo. Ontem a noite, mesmo, pensando em como colocar a minha vida para andar, percebi o quanto desta mesma vida está dedicada para essa pessoa e eu não sei ser outra coisa. Preciso aprender a apreciar a morte desta minha parte que é para ele e fazer uma nova crescer no lugar. Como fazem os enxertos nas peles de quem sofre um acidente, só que mais bonito. Eu não me arrependo de absolutamente um instante vivido ali com esta pessoa tão maravilhosa. Ainda sinto seu cheiro quando fecho os olhos, ainda ouço sua voz me zoando com os diversos apelidos que criávamos para encher o saco. E saiba que isso dói pra caralho. Tento não me convencer de que eu sou uma pessoa ruim. De que eu agi de maneira egoísta, mas eu não consigo deixar essa minha parte de lado. Aquela sirene que cresce incessantemente dentro do peito gritando que as coisas estão muito erradas e que é preciso mudar.

Eu não conheço outro jeito a não ser me afastar, e eu corri. Corri até minhas pernas ficarem cansadas. Corri até que as unhas sangrassem nos sapatos e que meu fôlego ardesse dentro do peito. Corri até não mais aguentar e o suor queimar as vistas. Corri para dentro de mim, tranquei todas as portas, fechei as janelas e sentei num canto escuro e desatei a chorar. Chorava, chorava. Ainda agora, choro um pouquinho, e sei que vou chorar muito tempo. Meu aniversário está próximo e eu queria sair com ele. O aniversário dele está próximo, e eu queria sair com ele. Me sinto tão doente a ponto de não entender se o que eu faço é real, é coisa da minha cabeça, ou se eu poderia ter aguentado mais um pouco ali. Me sentia feliz de falar com ele, ainda que com a expectativa de que a qualquer momento ele aparecesse com outra pessoa. Era sempre um risco: 50% vamos voltar, 50% ele já seguiu e se foi. E com isso minha vitalidade já tinha ido pro saco. Meu corpo cansado, dormiu quase 12h depois da decisão final. Me senti horrorizada de perceber meu desgaste energético tão profundo! Imagino que ele também esteja assim, cansado, exausto. Exaurido.

Falei de confiança lá no começo porque eu sinto isso, confio no que eu conheço a seu respeito. E sei que mesmo chateado comigo ele vai me entender, assim como eu entendo que não é fácil ter uma mulher maluca na sua bota o tempo todo. Eu entendo que não é fácil lidar comigo, e que as vezes irrita ter paciência o tempo todo. Mas sabe, não é por mal, eu não estou bem. A instabilidade que me ocorre é muito mais por querer me livrar do mal, do que por ser alguém assim. Pedante. Confio muito no seu julgamento, muito embora você não tenha falado comigo depois daquele áudio, eu sei que pra você também é difícil. A gente sempre contou um com outro, agora não é diferente, eu conto com você, que você me entenda. Que você perceba o quanto de dor eu carrego por não saber lidar e que por isso eu tomei minhas decisões. Eu fiz o quê fiz porque eu sei que eu vou atrás, romper com os meus próprios limites para procurar um vazio entre nós que entristece a ambos.

É, eu sei, somos muito parecidos, ninguém merece ser tratado assim.
Não se zangue comigo, eu só não sei mais o que fazer para me sentir em paz, e não digo nem feliz. Em paz. Sem dor no coração, sem angústia, sem desejo de coisa que não vai acontecer, entende?

Entende que eu preciso te dar essa paz também? Tenho tanto no peito para ser dito, talvez um dia a gente converse mais sobre isso.

Eu amo você, espero que me perdoe.

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Written by Louise Nazareth

Crônicas para compreender, transformar. Por uma vida anti-rótulos, liberta. Escrita livre para desabafar, entender, passar um tempo.

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